O velho e o novo: unindo estratégias e saberes do passado, presente e futuro na melhoria dos processos de ensino e de avaliação da aprendizagem

Em todos os tempos a escola teve um grande objetivo: a aprendizagem dos alunos. O que mudou na história da educação em contexto escolar foi o conceito do aprender. Na evolução deste termo passou-se da aprendizagem entendida como aquisição e acúmulo de informações, para o foco da aprendizagem como construção de significados, ou seja, para a aprendizagem significativa. Esta, por sua vez, está evoluindo para aprendizagem como desenvolvimento de competências para resolver situações complexas. Foi nessa linha de mudanças que evoluiu o conceito do ensinar, passando do ato de transmitir informações para o de elaboração de condições favoráveis à aprendizagem significativa.  

Na mesma direção evoluiu o conceito de gestão da escola que se baseava inicialmente em princípios de administração clássica e que hoje precisa evoluir para o de desenvolvimento de uma liderança que gerencie pessoas a partir de seus processos produtivos na prática educativa, fazendo com que se desenvolva de fato a educação pretendida na concepção pedagógica do termo. 

A conjugação da reflexão pedagógica moderna com a de um modelo de gestão atualizado e focado em resultados permite indicar metodologias de trabalho que associem educação e gestão com o intuito de resolver problemas que se fazem presentes nas escolas, como: o problema das atividades de “para casa”, as dificuldades de leitura, os problemas de desempenho acadêmico, entre outros. 

Uma gestão pedagógica que oriente, acompanhe e avalie os processos do ensino, da aprendizagem e da avaliação, constitui o objeto de nossa reflexão. Nestes três aspectos procuramos ver o que a escola tradicional teve de bom e pode ser melhorado. Ao mesmo tempo projetamos o que se exige na escola do presente para responder às necessidades de uma sociedade que se revela cada dia mais complexa com reflexos importantes para a sociedade do futuro. 

É no processo da avaliação da aprendizagem que se manifestam os resultados dos dois outros processos: o da aprendizagem e o do ensino. Nesta linha de pensamento podemos nos perguntar: qual o significado de uma avaliação aplicada como ferramenta para a construção de uma escola de qualidade e de que forma os resultados da avalição podem ser usados como indicadores para novos rumos dentro da escola? 

Para responder a esta questão precisamos pensar no que pode significar a expressão escola de qualidade. O processo da avaliação da aprendizagem deverá ser coerente com o modelo escolhido pela escola. Esse modelo é definido na missão expressa no Projeto Político Pedagógico (PPP). Se por um lado a escola estabelece que sua qualidade se mede pela capacidade de seus alunos de acumularem informações e reproduzi-las em exames, os instrumentos de avaliação terão como foco verificar a capacidade dos alunos de responder questões que testem mais memória do que compreensão. Por outro lado, se a missão da escola for formar cidadãos competentes que aprendam significativamente então o foco do processo da avaliação da aprendizagem deve ser outro, ou seja, estar voltado para a verificação da compreensão, assimilação e apropriação significativa de novos conhecimentos. No primeiro caso o aluno certamente não poderia consultar anotações durante as provas e nem usar calculadora, uma vez que, segundo o modelo, deveria saber tudo de cor. Alega-se, como justificativa desse modelo, que nos vestibulares o aluno também não poderá consultar e nem usar calculadora. Contudo, para o segundo modelo de escola, o que importa é desenvolver no aluno a capacidade de aprender significativamente. E isso implica na capacidade de estabelecer relações num universo simbólico para resolver situações complexas. 

Na mesma linha de reflexão colocamos outra questão: o que dizer do papel da avaliação quando escolas e educadores a utilizam como um instrumento de classificação, seleção e até de exclusão? Neste caso, a qualidade da escola é medida pela quantidade de informações acumuladas que promove nos alunos e pela utilização correta que eles fazem nos processos de avaliação. As notas obtidas pelos alunos são o indicador da qualidade da aprendizagem. Uma vez que os alunos deverão demonstrar capacidades de obter, guardar e utilizar informações, eles serão classificados de acordo com seu rendimento neste parâmetro. Os ótimos e bons serão elogiados e premiados, os medianos serão incentivados a melhorar as notas e os de baixo rendimento serão colocados em recuperação quando não excluídos da escola. No meu entender, este é um modelo cruel de educação em contexto escolar, pois desrespeita os que mais precisam de apoio. É uma triste forma de exclusão não declarada. No entanto, se defendem os que adotam esse modelo: “nossa sociedade é assim mesmo; vivemos numa sociedade competitiva e quem vence são os melhores”. Para quem pensa assim, o respeito às individualidades, às características de personalidade de cada aluno, às suas preferências e tendências, pouco importa. Para todos são feitas as mesmas questões, e todos devem dar as mesmas respostas, pois o que importa é o resultado, ficando em segundo plano o processo da aprendizagem e a preocupação com as múltiplas potencialidades dos alunos. Esse é um modelo de escola. Sabemos que há quem opte por ele. 

Reverter este modelo de avaliação é um grande desafio para alunos, pais, professores e instituições. Este desafio continuará até o momento em que se decidir mudar o modelo de escola. Ou seja, até o momento em que o foco da atividade pedagógica for a construção interativa do conhecimento em busca da aprendizagem significativa. No momento em que o modelo de escola estiver focado na formação do aluno como um pensador e não um mero acumulador de informações, a avaliação deixará de ser um momento de acerto de contas para ser um momento privilegiado de aprendizagem. O aluno deixará de ser pressionado para “provar” que sabe (saber aqui entendido como o resultado de ter feito muitos exercícios e responder corretamente outros semelhantes nas provas) e será estimulado a utilizar o momento da avaliação como um momento particularmente favorável a novas aprendizagens. 

Por isso a avaliação pode ser considerada uma parceira na busca do sucesso da aprendizagem, tanto para o professor como para os alunos. Para o professor, pois com ela terá o retorno da eficiência e da eficácia de sua atividade de ensino, pois pelos resultados vindos da avaliação o professor poderá avaliar-se e replanejar sua atividade em caso de insucesso demonstrado pelos estudantes. Para os alunos a avaliação também poderá ser uma grande parceira, pois o resultado permitirá analisar seus erros e retomar o estudo em busca de acertos. Mas essa parceria positiva só poderá ocorrer se tanto professores como alunos perceberem o erro como componente importante da aprendizagem deixando de ser motivo de punição para ser oportunidade de desenvolvimento.  

Com relação ao erro, não podemos deixar de reconhecer que há uma expectativa culturalmente estabelecida entre alunos, professores e pais: quando são aplicados os instrumentos de avaliação, espera-se que o aluno não erre. E o próprio aluno sabe que não deve errar, caso contrário será punido. E isso é verdade. O professor ensina esperando que o aluno aprenda e que não cometa erros. O aluno estuda e faz muitos exercícios de fixação para evitar os erros e mostrar que realmente aprendeu. Em concursos e provas de seleção o aluno procura não errar, pois seus erros serão sempre objeto de punição. Apesar disso tudo, deve-se entender o erro como elemento que pode ocorrer naturalmente durante o processo da aprendizagem. É nesta hora que o erro apresenta seu valor educativo, indicando ao professor quais são as dificuldades dos alunos e a estes em que pontos devem estar atentos refazendo seus caminhos durante a aprendizagem. Não se deve pensar que o erro é desejável e natural no processo da aprendizagem. Sabemos que o erro pode ocorrer mas não que necessariamente deva ocorrer. Assim, quando houver erro, cabe ao professor ter a sensibilidade de dar-lhe um sentido de oportunidade de correção de rumo e não de punição, considerando-o como um passo útil rumo ao sucesso e não como indicador de fracasso. 

Utilizar a avaliação como uma parceira para a melhoria da aprendizagem nos leva a analisar as diferenças (conceituais e práticas) entre “avaliação da aprendizagem” e os “exames escolares”.  

Quem desenvolve com maestria a “pedagogia dos exames” é o escritor e professor Cipriano Luckesi. Ao abordar o tema ele mostra que os exames escolares resultam de um modelo focado no produto e não nos processos de aprendizagem. Essa pedagogia é o grande desafio para alunos, professores e pais. Para os alunos o desafio é passar nos exames. Os momentos de exame passam a ser os momentos que chamo de “acerto de contas”. Na cabeça do aluno aparece uma sentença de morte: “Não estudou, não fez os deveres, bagunçou a aula, pois agora você verá o resultado”. Por isso, como escreveu Paulo Ronca, as provas (exames) passam a ser o centro da vida dos alunos: “Só se estuda se tiver prova; só se estuda para a prova; só se estuda se cair na prova; só se estuda o que cair na prova”. Por parte do professor, a avaliação no modelo da pedagogia dos exames, passa a ser um desafio e muitas vezes uma frustração: preparei minhas aulas, pensa o professor, ministrei-as com todo carinho e agora, na hora da avaliação, tantos alunos mostram que não aprenderam. Mesmo que alguém diga: “o problema é deles; fiz minha parte; se não quiseram aprender, azar é deles; eu vou em frente e eles que tratem de se recuperar e me acompanhar; considero matéria dada”, o fracasso dos alunos no momento da avaliação é frustrante para um professor.  Embora este pensamento possa parecer absurdo, ele ainda está presente em muitos que adotam o modelo da pedagogia dos exames. Finalmente, para os pais, esse modelo é um desafio. “Filho, amanhã tem prova, larga tudo e vai estudar”; “Filha, quanto você tirou na prova?” (Não se pergunta o que e quanto aprendeu, mas quanto tirou na prova.) “Sabe amiga, estou preocupada, pois programamos a viagem e meu filho tem exames finais e se não alcançar a nota (sempre a nota!), teremos que deixar de ir”.  

No modelo da “avaliação da aprendizagem” o foco não está no produto como no dos “exames”: notas, acertos, erros, classificação, médias, desvio padrão, como no dos exames que acabamos de descrever. Neste modelo importam também os produtos, mas o foco principal está nos processos que levaram o aluno a aprender. O propósito é promover condições que favoreçam a aprendizagem significativa dos alunos, isto é, que eles aprendam desenvolvendo sua estrutura cognitiva como uma rede de conceitos e relações que se movam interativa e dinamicamente em contínuos e constantes aprendizados. Para o aluno o desafio passa a ser a compreensão do que aprende, para o professor o desafio será de avaliar o desenvolvimento do aluno numa dimensão mais ampla do que apenas a acumulação de informações e para os pais, o desafio é acompanhar o desenvolvimento dos filhos no sentido de preparação para a vida com o desenvolvimento da cidadania, ou seja, para enfrentar com competência tanto a vida profissional quanto a familiar e a social. 

Para que os processos da aprendizagem e da ensinagem sejam eficazes é fundamental o papel do gestor escolar. Neste papel ele precisará ter clareza a respeito do modelo expresso no Projeto Político Pedagógico de sua escola. E, a partir daí, elaborar junto com toda a comunidade educativa que compartilha o projeto, estratégias para fazer a escola idealizada no PPP se tornar uma realidade. Para isto, deverá acreditar nele e dele se apropriar, procurando ajudar a comunidade educativa na plena realização da proposta pedagógica. Dentro do modelo adotado, cabe ao gestor acompanhar os processos e ações que respondam as questões fundamentais: como o aluno aprende como se deve ensinar e como avaliar a aprendizagem. Com as respostas em mãos, uma das funções essenciais do gestor é desenvolver e respeitar os parâmetros de qualidade pretendidos para a escola. Por exemplo, o gestor pode acompanhar os resultados dos rendimentos dos alunos comparando-os uns com os outros; pode também criar um sistema de padronização dos instrumentos de avaliação; pode contratar um profissional que leia criticamente as provas elaboradas e discuta com os professores tanto o conteúdo avaliado quanto a forma dos instrumentos utilizados. Neste caso, a criatividade, a contextualização e a linguagem deverão estar no foco da análise.  

Como conclusão de nossas reflexões, ressaltamos a importância para a escola de hoje em  mudar de modelo tanto para os processos de ensino como para os de avaliação da aprendizagem, tendo em vista as exigências de uma sociedade em rápidas transformações. O aluno precisa ser preparado para ser um pensador e não apenas como um acumulador de informações. Precisa desenvolver competências para encontrar solução de problemas postos tanto por situações inéditas, como para o inédito que aparece em situações rotineiras. Em síntese, a escola deverá preparar o aluno para ser um eterno aprendiz: aprender a aprender ao longo sua vida social e profissional.